Esse texto, foi escrito em dezembro de 2016 no facebook da juíza Ludmila Lins Grillo, e reproduzido, sem que tenha perdido sua atualidade, pelo Dr. Edailton Medeiros, de Campina Grande-PB, no prgomessilva.blogspot.com.br em 4 de maio
“Sempre
que o STF profere alguma decisão bizarra, o povo logo se apressa para
sentenciar: “a Justiça no Brasil é uma piada”. Nem se passa pela cabeça da
galera que os outros juízes – sim, os OUTROS – se contorcem de vergonha com
certas decisões da Suprema Corte, e não se sentem nem um pouco representados
por ela.
O que muitos juízes sentem
é que existem duas Justiças no Brasil. E essas Justiças não se misturam uma com
a outra. Uma é a dos juízes por indicação política. A outra é a dos juízes
concursados. A Justiça do STF e a Justiça de primeiro grau revelam a existência
de duas categorias de juízes que não se misturam. São como água e azeite. São
dois mundos completamente isolados um do outro. Um não tem contato nenhum com o
outro e um não se assemelha em nada com o outro. Um, muitas vezes, parece atuar
contra o outro. Faz declarações contra o outro. E o outro, por muitas vezes,
morre de vergonha do um.
Geralmente, o outro prefere
que os “juízes” do STF sejam mesmo chamados de Ministros – para não confundir
com os demais, os verdadeiros juízes. A atual composição do STF revela que,
dentre os 11 Ministros (sim, M-I-N-I-S-T-R-O-S!), apenas dois são magistrados
de carreira: Rosa Weber e Luiz Fux. Ou seja: nove deles não têm a mais vaga
ideia do que é gerir uma unidade judiciária a quilômetros de distância de sua
família, em cidades pequenas de interior, com falta de mão-de-obra e de
infraestrutura, com uma demanda acachapante e praticamente inadministrável.
Julgam grandes causas – as
mais importantes do Brasil – sem terem nunca sequer julgado um inventariozinho
da dona Maria que morreu. Nem uma pensão alimentícia simplória. Nem uma medida
para um menor infrator, nem um remédio para um doente, nem uma internação para
um idoso, nem uma autorização para menor em eventos e viagens, nem uma
partilhazinha de bens, nem uma aposentadoriazinha rural. Nada. NADA.
Certamente não fazem a
menor ideia de como é visitar a casa humilde da senhorinha acamada que não se
mexe, para propiciar-lhe a interdição. Nem imaginam como é desgastante a visita
periódica ao presídio – e o percorrer por entre as celas. Nem sonham com as
correições nos cartórios extrajudiciais. Nem supõem o que seja passar um dia
inteiro ouvindo testemunhas e interrogando réus. Nunca presidiram uma sessão do
Tribunal do Júri. Não conhecem as agruras, as dificuldades do interior. Não
conhecem nada do que é ser juiz de primeiro grau. Nada. Do alto de seus carros
com motorista pagos com dinheiro público, não devem fazer a menor ideia de que
ser juiz de verdade é não ter motorista nenhum. Ser juiz é andar com seu
próprio carro – por sua conta e risco – nas estradas de terra do interior do
Brasil. Talvez os Ministros nem saibam o que é uma estrada de terra – ou nem se
lembrem mais o que é isso. Às vezes, nem a gasolina ganhamos, tirando muitas
vezes do nosso próprio bolso para sustentar o Estado, sem saber se um dia
seremos reembolsados – muitas vezes não somos.
Será que os juízes, digo,
Ministros do STF sabem o que é passar por isso? Por que será que os réus lutam
tanto para serem julgados pelo STF (o famoso “foro privilegiado”) – fugindo dos
juízes de primeiro grau como o diabo foge da cruz? Por que será que eles
preferem ser julgados pelos “juízes” indicados politicamente, e não pelos
juízes concursados?
É por essas e outras que,
sem constrangimento algum, rogo-lhes: não me coloquem no mesmo balaio do STF.
Faço parte da outra Justiça: a de VERDADE.”
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