Ódios e rancores, elogios e esperanças são lançados numa
única direção quando se discute ou se pensa sobre o “desenvolver” nossa Capital
ou qualquer outro município: sua Câmara de Vereadores.
Ali residem as mazelas ou os sucessos de uma administração.
É dali ou através dos vereadores que o erário toma os caminhos da legalidade ou
da ilegalidade. O grande fosso a engolir verbas, os dutos pelos quais o
dinheiro público se esvai.
Será?
A base que sustenta o iceberg
Uma das mais interessantes metáforas que existem é a do
Iceberg. Pode ser utilizada para explicar fenômenos sociais, ou fazer críticas
a acontecimentos que escondem mistérios. No caso dos vereadores, a parte visível
é o seu mandato, sua exposição quase diária na Câmara. A base de sustentação
comporta toda uma enorme gama de pessoas, empresas e entidades ligadas ao seu
mandato. Algumas são democraticamente aceitas, outras são apenas apêndices
podres que sugam os poderes e, através dele, a sociedade, o município, o estado
e o país...
Normalmente enxergamos
o lado formal do trabalho de um vereador. Temos o conhecimento – agora mais
claro e acessível graças à Lei da Transparência – do universo de assessores de
gabinete, considerados em nossa democracia, essenciais para o bom
desenvolvimento do mandato; reforço, em nossa democracia, pois que em países
mais desenvolvidos são necessários apenas um ou dois assessores e os edis não
recebem salários para essa atividade.
Entretanto, por detrás
existem incertezas que não podem ser desvendadas, como agendas ocultas,
comunicação informal, acordos não explícitos etc.
A eleição de um
vereador tem custo alto e essa verba não cai do céu, nem é suprida pela verba
partidária, nem sempre é registrada em prestação de contas. O eterno Caixa Dois.
Existem dois lados
nessa questão: É meritório que os vereadores lutem por uma série de questões
que envolvam benefícios para os bairros, mormente os mais carentes, categorias
profissionais das mais diversas, escolas e seus corpos docente e discente e até
fortaleçam partidos para que estes cumpram seu deve constitucional de
representar, pensar o país e apresentar projetos que beneficiem a coletividade
buscando sempre o bem comum. Existe o outro lado, onde a necessidade da
conquista de votos torna o eleito, refém de aproveitadores. Se falta caráter na
Câmara, não sobra dignidade para uma vasta legião dos achacadores que rondam o
legislativo e o executivo municipal, estadual ou federal.
Abaixo, alguns
grossos exemplos. Não destrincha os descaminhos do poder, mas leva o leitor a
pensar e questionar atos e atitudes.
Como se elege um vereador?
O cidadão,
devidamente registrado em um Partido Político, coloca seu nome para indicação à
disputa eleitoral. Para isso, deve apresentar as condições exigidas por cada
partido – isso varia de acordo com a legenda. Mas um Partido não é formado
apenas pelos candidatos, existem os filiados, pessoas que, pelas mais diversas
razões, integram a legenda e, em época de eleições trabalham angariando
simpatias e votos para seus candidatos. Não recebem (oficialmente) para esse
trabalho, não fazem parte dos cabos eleitorais contratados e registrados
conforme exige a legislação. Essa é a parte salutar da democracia
(entendendo-se que a motivação para a filiação partidária se dê em função de um
trabalho cívico pela melhoria da Nação).
Mas isso não é
suficiente. A sociedade necessita de núcleos de controle e ação para que os
trabalhos governamentais se realizem com mais presteza e alcancem os objetivos
concretos que beneficiem cada parcela de acordo com suas necessidades. Então, a
sociedade civil se organizou em Conselhos, Associações, Agremiação, Sociedades,
Sindicatos... e muitas dessas se transformaram em verdadeiras arapucas que
mantém atados às suas garras os membros do legislativo e executivo. Uma troca
constante de favores que rendem benesses para quem está ligado ao vereador e
votos futuros a estes.
Um exemplo claro é a
“presidência de bairro”, eleita normalmente por uma minoria que se reveza no
poder. No início era pessoas manipuladas pelos vereadores, que utilizavam sua
experiência em conquistar votos, repassando aos candidatos e, assim que estes
eram eleitos, ficaram sob seu comando e ordem. Até que, de caçadores, se
transformaram em caça. Hoje, este poder paralelo negocia favores com os
vereadores, mantendo-os acuados. Ficaram caros e, salvo raras exceções, de tudo
o que conseguem, pouco ou nada chega em termos de melhoria para os bairros...
suplantaram seus mestres e mentem com muito mais maestria. Exemplos: conseguem
um ginásio de esportes e entregam um campinho... tem sempre algum parente
empregado em cargo comissionado, são contemplados com o Caixa Dois em períodos
eleitorais, ganham poder na comunidade negociando favores e benefícios.
Diretores de Escolas
obedecem ao mesmo processo: precisam da experiência adquirida pelos vereadores
para conquistarem os votos dos pais, alunos e corpo docente. Os vereadores
investem nisso, muito. Os diretores e coordenadores ganham um determinado poder
sobre os seus pares, aumento salarial e distância da sempre desgastante sala de
aula. Os vereadores vão cobrar seus votos a cada quadriênio.
Presidentes de
sindicatos e associações, idem. Têm sob seu domínio uma massa de trabalhadores,
sempre carentes de melhores condições de trabalho e salário, principalmente
respeito ao seu trabalho. As negociações de apoio envolvem promessas de luta
por benefícios para sua categoria.
Os financiadores de
campanha, em uma democracia cidadã, deveriam ser empresas ou pessoas que
pretendem, com o desenvolvimento social, seu próprio desenvolvimento. Ou seja,
financio um projeto político porque acredito que ele possa melhora a sociedade,
torná-la mais igualitária, com melhor qualidade de vida, que traga
desenvolvimento social e econômico; portanto mais desenvolvimento econômico
social é igual a maior mercado para mim, maiores possibilidades de ganho.
Seria, mas a ganância de quem não mais acredita nos poderes constituídos e que,
obedece à anedota que diz que cada empresa se faz com três sócios –Deus que
ajuda, eu que trabalho e o governo que toma tudo – muda essa relação para um
toma-lá-dá-cá na base do eu te financio e você dá um jeito de beneficiar minha
empresa em detrimento dos concorrentes, geralmente com contratos negociados com
o próprio legislativo ou com o executivo, quando se é base e não oposição.
Comprometimento
Vereadores se envolvem com o principal foco de tentativa de corrupção, a prefeitura,
que detém a chave do cofre. Alguns prefeitos optam pelo oferecimento de uma
“ajuda de custo”, comprando em empresas que financiaram tal ou qual vereador,
nomeação de parentes e filiados ao partido etc. Estes vereadores, então, numa
troca de favores fazem vistas grossas e impedem que se apurem irregularidades
na gestão do executivo municipal, porque se este governo perder as eleições,
investigações podem ser levadas a cabo e a sujeira certamente respingará neles
também.
E assim se sustenta
a ponta do iceberg.
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