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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Sentimentos

O texto abaixo foi escrito por Carla Andrade, tia de uma das Aspirantes selecionadas. Vale a leitura !!!

Não concordo "literalmente", mas tenho que dar o devido valor

De todas as transformações que o nosso país enfrenta, não tenho dúvida que a pior delas é inversão de valores.

Não estou falando dos atores, mas da plateia.

Quem determina o sucesso de um espetáculo é o público. Por melhor que sejam os atores e o enredo, se o público não aplaudir, a turnê acaba.

Nós somos a sociedade, nós somos a plateia, nós dizemos qual o espetáculo deve acabar e qual precisa continuar.

Se nós estamos aplaudindo coisas erradas, se damos ibope a pessoas erradas, de que estamos reclamando afinal?

Somos nós que continuamos consumindo notícias de bandidos presos e condenados.
Somos nós que consumimos notícias de arruaceiros que ganham mesada para depredar o nosso patrimônio.

Somos nós que damos trela para beijaços, toplessaços, marcha de vadiaças, dos maconheiraços, dos super-heróis que batem ponto em “manifestações” (e que gostam de cozinhar-se dentro de uma fantasia num sol de 45 graus), e todos os tipos de histéricos performáticos que querem seus 15 minutos de fama.

Quando fazemos isso, estamos dando-lhes valores que não têm. Estamos dando-lhes atenção. Estamos dedicando-lhes o nosso precioso tempo.

Passou da hora de dar um basta nisso!

Por que os nossos jornais estão recheados de funkeiros ao invés de medalhistas olímpicos do conhecimento?

Por que vende-se mais jornal com notícia de um funkeiro que largou a escola por já estar milionário, do que de um aluno brilhante que supera até seus professores?

Por que sabemos os nomes dos BBBs e não sabemos os nomes dos nossos cientistas que palestraram no TED?

Por que muitos não sabem nem o que é o TED? Ou Campus Party?

Por que um evento histórico para o Brasil como o ingresso da primeira turma feminina da Escola Naval não é noticiado?

Por que um monte de alienadas com peitos de fora, merecem mais as manchetes do que as brilhantes alunas, que conquistaram as primeiras 12 vagas, da mais antiga instituição de ensino superior do Brasil?

Por que nós continuamos aplaudindo a barbárie, se ainda temos valores?

O país não mudará se nós não mudarmos o foco!

Os políticos não mudarão se nós não refletirmos a sociedade que queremos!

Já passou da hora de nos posicionarmos!

Ostracismo a quem não merece a nossa atenção e aplausos para quem faz por merecer.

Merecer! Precisamos devolver essa palavra para o nosso dicionário cotidiano.

Meu coração ao olhar essa foto hoje, se divide em vários sentimentos distintos.

Muito orgulho de ser mulher e me ver representada por essas guerreiras.

Elas não estão fazendo arruaça pleiteando igualdade. Elas conquistaram a igualdade estudando e ralando muito.

Elas tiveram que carregar na mão as suas malas pesadas no dia que entraram na Escola Naval. Não puderam puxar na rodinha não! Tiveram que carregar na mão igual aos aspirantes masculinos.

Elas foram e fizeram.

Mas ao contrário das feministas de toddynho, não estarão nas manchetes dos jornais de hoje. E isso me evoca outros sentimentos.

Sentimentos de revolta, de vergonha, e de constrangimento frente a essas mulheres, que não serão chamadas de heroínas por apresentadores de televisão. Mas estão dispostas morrer como heroínas por nosso país.

Parabéns Primeira Turma Feminina da Escola Naval de 2014. Vocês são a dúzia que vale muito mais que milhares

Carla Andrade

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Assim tropeça a humanidade - Dante Filho

Artigo do jornalista Dante Filho*

Em fevereiro do ano passado, no ato comemorativo dos 10 anos do PT no poder, militantes animadinhos espancaram uma jornalista da Folha de São Paulo, derrubando-a no chão com chutes na barriga e, aos berros e com os dedos em riste, chamaram-na de “prostituta da imprensa”.

O fato teve tratamento tímido na mídia. Repercussão quase zero. Mas ali estava configurada uma metodologia de relação das “esquerdas” com a “imprensa burguesa”. Desse jeito, passo a passo, num processo de reverberação espontânea, chegaria até os dias de hoje com o assassinato do cinegrafista da Band, Santiago Andrade.

Quem imagina que uma coisa que ocorreu no passado não tem relação com este trágico acontecimento recente não conhece a vida. A violência é um fenômeno que, quando não contido na origem, entra em fase de expansão contínua. Sem freios, não há limites. Na maioria das vezes a resposta deve ser entrópica, pela força de reação equivalente ou pela aplicação rigorosa da lei. Deixando tudo rolar – como vem acontecendo -, retroage-se ao estágio da barbárie, com homens se transformando em lobo dos homens.

O ponto de inflexão deste desdobramento histórico foram as jornadas de junho: a massa difusa saiu às ruas pacificamente e os partidos de esquerda apresentaram-se para brincar juntos. Foram rechaçados. Daí, a militância ressentida partiu para a ignorância. Foi como se dissessem: “se não podemos entrar na brincadeira, vamos melar tudo”. E partiram pro pau, contratando black blocs para a linha de frente da quebradeira.

Nesse bafafá, no mundo paralelo das redes, a imprensa tornou-se a principal inimiga a ser combatida. Abriu-se a temporada de caça aos jornalistas. A chamada grande mídia entrou na clandestinidade para poder trabalhar na cobertura das manifestações.

Uma coisa meio surrealista, mas que tinha certa lógica: a turma ninja desejava a conquista da hegemonia da informação sobre acontecimentos sociais cuja pauta teria que ser, obrigatoriamente, propriedade privada de grupos minoritários do quebra-quebra.

Muitos profissionais da imprensa entraram neste jogo, achando que defendendo “a causa” dos revoltadinhos de boutique ganhariam a simpatia dos seus algozes. Santa ingenuidade. Mesmo assim, o mundo seguiu seu curso. E a massa se afastou das ruas com medo. O PT e congêneres ganharam a parada. Arrefeceram as manifestações.

Até a semana passada a coisa vinha dando certo. A política de hostilização de jornalistas inspirada por Franklin Martins & associados ganhava espaço com a formalização da ideia de que havia no País uma “mídia golpista”. Mais: que essa imprensa havia se transformado num partido político contra um governo popular.

Por incrível que pareça, tem gente que acredita nessa maluquice. É plausível que numa democracia grupos sociais tenham direito de vender sua versão da realidade para conquistar corações e mentes. Mas a subversão de fatos, com a tentativa de mistificar a política com teorias conspiratórias, inventando inimigos imaginários apenas visando demarcar espaço eleitoral, deveria ser objeto de condenação não somente ética, mas também legal, principalmente se isso leva a atos violentos.

A lavagem cerebral a que vem sendo submetida uma boa parcela da moçada de esquerda contra conceitos de liberdade de expressão e opinião – com todos os relativismos que isso impõe – fará germinar um tipo de fascismo cujos primeiros sintomas estamos presenciando nos últimos dias.

Pelas informações disponíveis, mesmo com o trauma provocado pelo assassinato do cinegrafista Santiago Andrade, os enfurecidos remunerados não darão trégua: querem mais sangue, suor e lágrimas. Como disse um dia aquele francês, passaremos da barbárie à decadência sem nunca ter conhecido a civilização.

*jornalista e escritor (dantefilho@terra.com.br)