Por Carlos Castilho em 21/06/2013 no Observatório da Imprensa
O
ruído político produzido pelos milhares de pessoas que ocuparam as principais
ruas e avenidas nas maiores cidades brasileiras durante uma semana foi
suficientemente forte para provocar um grande sustonas
elites dirigentes do país.
O
resultado da inédita onda de protestos será medido pelo temor despertado entre políticos,
governantes, burocratas oficiais e empresários, mais do que pelo eventual
atendimento de reivindicações. O ruído das ruas é muito mais significativo
porque ele mostra que uma enorme parcela de brasileiros já não se conforma mais
em não ser levada em conta.
Mas
nada garante que o rugido das multidões será ouvido por quem deveria estar
atento ao que se passa nas ruas – que uma empresa automobilística definiu como
a maior arquibancada do país. O formato não estruturado e sem comandos
centralizados presente nas manifestações cria a possibilidade de que um
segmento volte às ruas ao sentir-se enganado, abrindo a possibilidade de contágio
rápido e imprevisível.
Até
mesmo o vandalismo deixou lições.
Mostrou que um grupo de agitadores tem condições de enfrentar um sistema de
segurança pública que revelou despreparo para lidar com multidões. A polícia
preferiu a tática do ataque frontal com bombas de gás, atingindo indiscriminadamente
os vândalos e manifestantes pacíficos, gerando raiva e resistência. O mais
adequado seria isolar os agitadores atuando de forma cirúrgica e com
superioridade numérica. É o que as polícias de Inglaterra e da França fazem
rotineiramente. Deu pena ver 15 guardas municipais de São Paulo tentando
impedir a invasão da prefeitura diante de quase cinco mil manifestantes.
A
vulnerabilidade diante dos vândalos e a perplexidade dos tomadores de decisões
diante da manifestação inequívoca de que as pessoas exigem serem ouvidas deveria
preocupar – e muito – os políticos, governantes e autoridades
de segurança. A onda de protestos estabeleceu uma espécie de padrão de
comportamento do público que agora espera para ver o que as autoridades farão
em resposta ao rugido das ruas.
A
redução dos preços das passagens de ônibus é um recuo tático das prefeituras e dos empresários, mas a
verdadeira solução só virá com a abertura da caixa-preta contendo os dados e
cálculos para a fixação das tarifas. Essa caixa-preta existe há décadas
protegida pela cumplicidade corrupta de donos de empresas e funcionários
públicos, sem distinção de partidos.
No
caso dos gastos com a Copa do Mundo, a caixa-preta é ainda maior porque não se sabe quais os
compromissos reais que o país assumiu com a FIFA, um sindicato de cartolas que
administra o negócio do futebol com financiamento de cervejarias e
multinacionais de equipamentos esportivos. O estouro dos orçamentos nas obras
para a Copa é generalizado, faltando ainda um ano para o início da competição.
Os
estádios ficarão prontos. Alguns poucos aeroportos serão reformados, mas os
projetos que deveriam beneficiar a população – como transportes coletivos e
melhorias na mobilidade urbana – ficarão no papel,
para variar. Os benefícios reais para a população serão mínimos. Até o futebol
foi europeizado pela FIFA com a cumplicidade da CBF, do Ministério dos Esportes
e de emissoras de televisão. Os brasileiros capazes de pagar 400 reais ou mais
por um ingresso terão que esquecer que são torcedores comuns para seguir as
regras de comportamento ditadas pela FIFA e convencer-se de que terão de se
comportar nos estádios como se estivessem numa sala de teatro.
O fim
da corrupção, cobrado pelos milhares de manifestantes em cerca de 100 cidades
brasileiras, é umareivindicação
complexa. Não dá para acabar com a roubalheira por decreto. O
cidadão comum não tem condições de entender as filigranas jurídicas de um
processo legal sobre corrupção. A possibilidade de impunidade é estrutural em
nosso sistema penal. Por isso a chance de frustração é grande e a possibilidade mais realista de um
recuo na corrupção é a de que novas manifestações de rua criem situações cada
vez mais insustentáveis para os corruptos.
Tudo
isso mostra que o rugido das ruas vai ficar como uma espécie de espantalho
pairando sobre Brasília, Rio, São Paulo e outras capitais. Este é talvez o
grande resultado da maior onda de protestos deste país nos últimos 50 anos, um
fenômeno de dimensões globais que indica uma mudança social ainda não definida.
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