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sábado, 20 de setembro de 2014

Nosso voto não tem qualidade, apenas se vota 'porque sim'

Parafraseando a publicidade de cerveja, podemos dizer que 'votamos porque sim'. Sem necessitar de qualquer explicação e sem poder dar uma única razão para isso. Apesar de a política apresentar tantos escândalos, nós votamos
e vota 'porque sim'

Não passa um dia sequer que não tenhamos uma denúncia contra algum político ou contra um grupo de políticos. Denúncias e não escândalos, porque escândalo é algo que causa perplexa indignação, e o envolvimento de nossos políticos de todas as cores, de todos os cargos em tantas e tão constantes causas ilegais e imorais, já não nos surpreende, sequer nos afeta como deveria.

Votar é quase participar de um jogo mórbido. A relação entre o político e o eleitor deixou de ser uma relação entre cidadão e cidadão onde o primeiro decide pelo segundo para que lhe represente. Elegemos os atores que interpretarão uma peça nonsense (que pode significar absurdo, algo que foge à lógica, ou conduta questionável). Nesta peça não serão atônitos expectadores e sim uma plateia participante, repetindo o roteiro ensaiado das críticas, dos xingamentos, de falsas perplexidade e asco, mas também de inveja.

Nossa política é quase uma cidadela sitiada onde uma imensa tropa pretende entrar e se estabelecer.

Então, por quê?
Porque sim. “Porquês”. São vários os motivos. Talvez porque a cidade não pode ficar acéfala, sem uma representação hierárquica em sua administração. Votamos nos nomes que nos impõe. Votamos porque simpatizamos com este ou aquele candidato. Votamos porque nos reconhecemos neles.

Mas não sabemos votar, sequer sabemos exercer nossa cidadania.

Cidadania é abrangente, começa pelo gesto de não jogar papel na rua, não pichar muros, respeitar sinais; e atinge níveis mais complexos que dão aos cidadãos o direito à liberdade, à propriedade e à igualdade perante a lei. Cidadania é participar do governo através de manifestações políticas, discussões dos problemas, oferecer soluções, questionar.

Nós apenas votamos. Nada mais. Usamos do voto para tiramos dos nossos ombros os (pesados) encargos de sermos cidadãos melhores.

A discussão política que se faz não é a respeito dos projetos, nem se as propostas de campanha são factíveis, ou ainda se o candidato tem capacidades para realizar tal obra. O debate entre eleitores focam na troca de acusações, na disputa entre o número de processos que tenham contra si, os desvios e falcatruas dos quais participou. Estranhamente idolatram o mascarado que está acima da Lei.

Por isso os debates entre os candidatos tornaram-se vazios. Antes até, os adversários políticos dividiam suas falas em: apresentar seus programas de governo e; lançar denúncias contra os adversários. Depois percebeu-se que os mais atacados, aqueles que tinham mais denúncias expostas eram os que conquistavam mais simpatias da população. Ele faz e a justiça não o alcança; ele é esperto, eu gosto dele.

Hoje as acusações são mais amenas. Jogam o jogo do “eu sei o que você fez, mas não posso falar porque fiz parecido”. Os debates são meras apresentações de programas elaborados de forma publicitária versando sobre assuntos e coisas que mais afligem a população, ou que tenham mais destaque na mídia, sem que se apresente um único projeto consistente de como resolver essa ou aquela questão. Apenas uma ladainha do “eu vou solucionar os problemas da saúde pública que está uma vergonha; a questão indígena será resolvida em meu governo; crianças, adolescentes, mulheres serão protegidos com isso, com aquilo; construiremos creches e valorizaremos os profissionais da educação; a administração irá funcionar a contento porque os funcionários serão treinados e valorizados etc. etc. Etc.

Falta dizer “como?”.

Nosso voto não tem qualidade, porque nos atemos a votar. A cada dois anos assistimos e participamos desse enredo de comédia e dramaturgia, passado o show, vamos para o sol, vamos para a sombra, entramos na nossa modorrenta mesmice.

Nosso voto não tem qualidade porque não tem seguimento. Não exercemos nossa cidadania em momento algum. Não cobramos, não acompanhamos. Sequer nos lembramos em qual dos mascarados acima da lei, votamos.



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